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15/01/2024 às 11h28min - Atualizada em 16/01/2024 às 05h17min

Revisão da Vida Toda: desrespeito ao tribunal, seus pares e a colegialidade

Murilo do Carmo Janelli
Foto: Diogo Alves

Diogo Alves*

 

Desde a década de 1990, vê-se o esforço institucional do legislativo e judiciário (constitucional e infraconstitucional) em reforçar a orientação firmada pelos Tribunais Superiores e torna-las vinculantes, visando apaziguar a interpretação judicial, trazer equidade e segurança jurídica em situações semelhantes, a partir do entendimento colegiado das Cortes Superiores do país, STJ e STF.

 

A Emenda Constitucional nº 45/2004, introduziu o instituto da Súmula Vinculante, e, em adequação ao comando constitucional da Emenda nº 45/04, a Lei nº 11.418/06 acresceu os arts. 543-A e 543-B ao CPC/73. O primeiro regulamentou o instituto da repercussão geral.

 

Essa orientação foi reafirmada e reforçada com o Código de Processo Civil de 2015 (CPC/15 – Lei n. 13.105/15). O novo código estabeleceu, pela primeira vez no ordenamento processual brasileiro, um sistema de precedentes. O art. 926 trouxe como orientação a obrigatoriedade de os tribunais uniformizarem sua jurisprudência e de mantê-la estável, íntegra e coerente. Por sua vez, o art. 927 lista os “tipos” de julga¬mento de observância obrigatória pelos juízes e pelos tribunais, dentre eles os acórdãos em in¬cidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos; (v) a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados.

 

As hipóteses listadas incluem situações que são alcançadas necessariamente por meio do julgamento colegiado, conforme item “v” acima descrito, e justamente toda essa orientação acima construída em décadas, qual estabiliza a sociedade e os entendimentos judiciais neste vasto país, que o Ministro Zanin está desconstruindo ao não respeitar o precluso julgamento de mérito colegiado do tema 1.102 do STF e tentar sobrepor sua vontade própria ou a de quem lhe pede algum favor, ao entendimento já firmado pelo colegiado do STF, por via teratológica, totalmente transversa e ilegal, em desrespeito absoluto a seus pares no STF, ao Ministro que votou na cadeira que hoje senta, Lewandowisk, e à corte cidadã, STJ, que é responsável pela análise e interpretação de legislação infraconstitucional, qual é o caso da revisão da vida toda.

 

A atitude desrespeitosa de referido Ministro, viola a despersonificação, onde a decisão tomada pelo colegiado é resultado de um juízo construído pela instituição, dissociada de seus membros, reforçando o caráter da impessoalidade, da independência e da imparcialidade dos membros julgadores do órgão colegiado.

Tal arbítrio individual e absolutamente parcial e tendencioso, retrocede as evoluções legislativas e jurisprudenciais de se evitar a concentração de muito poder nas mãos de uma só pessoa, tutelando o jurisdi¬cionado e o conteúdo da prestação jurisdicional.  

 

A abertura a várias vozes e ao desacordo, além de traduzir o reconhecimento de que o conceito de Direito (ou a interpretação do Direito), por sua complexidade, deve estar aberto à argumentação e à divergência, proporciona a concretização do princípio constitucional do contraditório, enquanto garantia de participação influente das partes na elaboração do provimento judicial colegiado.

 

Como consequência, a colegialidade, ao aumentar o número de julgadores na tomada de decisões, amplifica a possibilidade de que o resultado seja uma melhor decisão, por instigar o diálogo, a difusão de novas ideias, a consideração atenta das críticas e a percepção de que o resultado do julgamento é coletivo e não individual.

A atitude do Ministro Zanin, viola frontalmente os quatro elementos da colegialidade — despersonificação, contenção do arbítrio indivi¬dual, abertura a várias vozes e ao desacordo e reforço das chances de acerto, reforço ao caráter colegial (ou deliberativo) que deve guiar os trabalhos nos Tribunais.

 

A possibilidade de um Ministro, após sedimentada a decisão colegiada da corte, alterar o entendimento do colegiado, revogar o voto da cadeira que assumiu,  trará imenso retrocesso e descrédito ao Tribunal e principalmente a seus pares do STF, que trabalharam por 3 anos em deliberações referente ao tema 1.102 do STF, e agora podem ver todo esse trabalho construído, jogado ao lixo, por vontade do devedor assessorado pelo citado Ministro, afrontando os princípios constitucionais do devido processo legal e do juiz natural, bem como do princípio da colegialidade.

 

O Ministro em comento, tenta invalidar o voto colegiado da cadeira do Ministro Lewandowski quanto ao mérito, e tornar seu voto individual um novo voto condutor da divergência já vencida, tentando julgar novamente o mérito sedimentado pelo colegiado.

 

E o mais espantoso, está sendo acompanhado pelo Ministro Toffoli, qual foi o idealizador da razões da questão de ordem no julgamento da ADI 5399 e que foi acompanhado por maioria e ficou consignado que, repito:

 

“Então, minha proposição, ao fim e ao cabo, é que nós, já com a experiência que temos vivido, façamos um aperfeiçoamento da resolução, prevendo que, no surgimento de fatos novos, a cadeira poderá falar, mas que fica preservado o voto já proferido. (pag. 21 acórdão ADI 5399)”.

Além de tentar alterar o mérito, o Ministro citado, não respeita o Regimento do Tribunal que atua, e afronta de forma desrespeitosa o voto do Relator e do Ministro que sucedeu a cadeira, já que o regimento é claro quanto a forma de voto dos seus pares:

“Art. 6º Os ministros poderão votar nas listas como um todo ou em cada processo separadamente.

§ 1º As opções de voto serão as seguintes:

 

a - acompanho o Relator;

b - acompanho o Relator com ressalva de entendimento;

c - divirjo do Relator; ou

d - acompanho a divergência.

e- acompanho o relator sem ressalva de entendimento com obrigação de me manifestar sobre todos os pontos do voto condutor (LEI criada EM 24/11/2023 por Cristiano Zanin)

 

O Ministro Lewandowski, acompanhou sem ressalvas o voto do Relator por duas vezes, não existindo qualquer omissão, justamente por ter acompanhado sem ressalvas, se houver alguma omissão, seria no voto do relator, e não do Ministro que acompanha sem ressalvas a integralidade do voto, um absurdo!

 

A sociedade acompanha o desfecho de tal situação, e acredita que a decisão colegiada já tomada, prevaleça, indicando ao novo Ministro, que o STF, apesar de sofrer influência política, é uma instituição íntegra e composta por 11 Ministros, quais já formaram a convicção colegiada do Tribunal, qual não poderá ser alterada pela vontade individual do recém empossado Ministro Zanin.

 

*Diogo Alves é advogado 


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