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07/03/2024 às 12h16min - Atualizada em 08/03/2024 às 08h11min

Perto da descriminalização, STF forma maioria sobre quantidade de porte de maconha para uso pessoal

A quantidade deve ser fixada em 60g, ou 6 plantas fêmeas

MP News
Divulgação

Claudia de Lucca Mano*

No último dia 6 de março, o Supremo Tribunal Federal (STF) retomou o julgamento de Recurso Especial de Repercussão Geral que define se o porte de pequenas quantidades de cannabis para uso próprio é considerado crime. Ainda resta um voto para a descriminalização somente do porte de maconha para uso pessoal. A análise do caso foi interrompida por um pedido de vista feito pelo ministro Dias Toffoli.  O placar atual é de 5 votos a 3. Entretanto, é importante destacar que todos os ministros votaram a favor da fixação de critérios objetivos para distinguir usuário de traficante. A quantidade deve ser fixada em 60g, ou 6 plantas fêmeas.

Na abertura da sessão no Plenário da Corte Superior, o presidente Luís Roberto Barroso fixou a controvérsia dupla em discussão: seria constitucional o art. 28 da Lei 11343/06, que enquadra usuários como criminosos? O judiciário deve operar com parâmetros objetivos para a diferenciação tráfico versus uso?

Barroso declarou que foi abordado por parlamentares da base evangélica e católica, que são contrários à chamada legalização. Assim, fez questão de esclarecer a terminologia mais adequada: despenalização. O julgamento não pretende legalizar a maconha, mas sim balizar parâmetros para diferenciar usuários de traficantes, retirando da esfera penal a posse de pequenas quantidades da droga ou planta para uso próprio.

Barroso destacou que as penas associadas ao porte de maconha não devem possuir natureza penal, questionando as consequências práticas, para além da primariedade. Atualmente, a lei prevê para usuários penas não privativas de liberdade a usuários: medidas educativas, prestação de serviços a comunidade ou advertência. Carmem Lúcia ressaltou que os condenados por porte de maconha podem encontrar dificuldades para se colocar no mercado de trabalho, por exemplo. No sistema prisional, a conduta afeta o acesso a benefícios como remissão de pena (por dias trabalhados) ou progressão para regime semiaberto ou aberto.

 Em 2023, o voto de Alexandre de Moraes levantou a complexa questão social que circunda o tema. Isso porque fica a cargo das autoridades policiais e judiciárias a interpretação dos casos, o que tem gerado discrepância de tratamentos entre diversos grupos sociais. Enquanto brancos, alfabetizados e privilegiados são considerados usuários com mais frequência, os cidadãos pretos, com baixa escolaridade e marginalizados são punidos como traficantes, mesmo portando a mesma quantidade de maconha.

 O voto do ministro André Mendonça sustenta a tese de que a posse de pequenas quantidades de maconha configura crime, acompanhando o ministro Zanin. Ele disse ainda que a Lei 11.343, de 2006, já teria destacado a separação entre usuários e traficantes no tratamento jurídico, de modo que o Congresso já se posicionou ao estabelecer penas alternativas à privação de liberdade. Na prática, o ministro foi contrário à chamada descriminalização, que, segundo ele, ocorreria com a retirada do uso da esfera penal (ou despenalização). Mendonça citou a dualidade do caso, concordando com a necessidade de estabelecer critérios objetivos para distinguir tráfico de uso.

 O ministro destacou também os malefícios da cannabis desde a dependência até os impactos em transtornos mentais e reprodutivos, apoiado em dados médicos. Mendonça disse que “transformar maconha em alimentos e cosméticos vai além do usuário e atinge a família e a sociedade”. Ou seja, ignorou os efeitos benéficos que produtos derivados de cannabis comprovadamente possuem na melhora da saúde e bem estar das pessoas, para tratamentos de doenças graves como epilepsia, síndromes neurológicas, transtorno do espectro autista e dores crônicas, por exemplo.

 Tocou ainda nas consequências sociais e políticas da legalização, citando experiências de outros países e estados americanos, que estudam recuar nas iniciativas semelhantes. Como exemplos, apontou a baixa percepção dos danos, pela população de locais onde ocorreu a legalização, bem como a frustração na expectativa de arrecadação tributária, em estados ou países que adotaram a medida. Assim, foi contra a descriminalização, mas a favor da definição das quantidades parâmetro. O ministro propôs a fixação de critérios objetivos quantitativos pelo Congresso Nacional. Sugeriu uma fase provisória de 180 dias, durante a qual o Congresso deve legislar e propôs como parâmetro cerca de 10g, ponderando que tal quantidade resulta em aproximadamente 34 cigarros.

Nunes Marques acompanhou Zanin e Mendonça, contra de descriminalização, abordando estudos médicos e a experiência internacional e mencionando a crise do fentanil e o aumento do consumo de drogas. Ele destacou a validade constitucional da discussão e deixou a responsabilidade para o Congresso decidir.

 A decisão provisória do STF, com maioria de 7 votos, considerou inconstitucional apenas parte das sanções previstas para o porte de maconha, retirando das penalidades a prestacao de serviços a comunidade. A maioria já concorda com critérios quantitativos de 25g a 60g, e até 6 plantas fêmeas para distinguir as situações.

 Ao final da sessão, o placar atual é de 5 votos a favor da não criminalização de usuários, 3 votos que mantém a conduta como crime e unanimidade quanto a necessidade de definição de critérios objetivos para diferenciação entre uso e tráfico, a ser definido pelo próprio Supremo ou pelo Congresso. Foram a favor da Inconstitucionalidade e definição de critérios objetivos: Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Edson Fachin. Foram contrários a descriminalização, mas a favor de parâmetros: Cristiano Zanin, André Mendonça e Nunes Marques.

E a votação só não foi encerrada no último dia 6 porque houve o pedido de vista do ministro Dias Toffoli, que suspendeu o julgamento.

Numa nota final, Toffoli destacou que é papel da Anvisa organizar e definir a lista de drogas licitas ou ilícitas no país, sinalizando que a agencia poderia regular a matéria, mas nada fez. De fato a agencia reguladora tem em mãos o poder de, inclusive, autorizar o plantio. Mas ser abstém, por opção e estratégia política, possivelmente receosa das repercussões negativas frente a opinião pública.

Agora, é necessário aguardar a devolução do processo para que ele seja novamente pautado e para que os ministros restantes possam votar.

*Claudia de Lucca Mano é advogada e consultora empresarial atuando desde 1999 na área de vigilância sanitária e assuntos regulatórios, fundadora da banca DLM e responsável pelo jurídico da associação Farmacann.

 


 
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