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14/06/2023 às 12h25min - Atualizada em 14/06/2023 às 12h25min

Gambá com 150 mil seguidores que era mantido em cativeiro sofre de obesidade mórbida

Em uma ação conjunta da Polícia Civil e do Comando Ambiental de Montenegro, um gambá foi resgatado no dia 6 de junho. Emilio, como é conhecido em suas redes sociais, estava com uma família há mais de um ano e meio.

Assessoria de imprensa
Foto: Arquivo Pessoal
Uma denúncia anônima foi feita à Delegacia do Meio Ambiente de Porto Alegre informando que o animal era mantido dentro de casa e que a imagem dele era usada em perfis em redes sociais, que acumulam mais de 150 mil seguidores.

De acordo com informações da fotógrafa que resgatou o animal, Schanacris Braga, ela o manteve em casa pois ele “ficou manso e as presas dele e os caninos são deficientes”.

Conforme a lei, manter animal silvestre sem autorização é crime.

Segundo a Polícia Civil, Schanacris é investigada por por manter animal silvestre sem autorização e por maus-tratos, que será confirmado posteriormente por eventual laudo.

“Manter animal silvestre sem autorização é crime, independente de estar em maus-tratos. Esse tipo de situação incentiva o tráfico de animais silvestres, pode propagar doenças, além de poder levar a espécie à extinção”, explica a delegada Samieh Saleh, responsável pela investigação.
Após o resgate, o gambá foi enviado para o Centro de Triagem de Animais Silvestres (Cetas) de Porto Alegre, uma unidade de recebimento de animais do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama). Quem está cuidando do animal, diz que a condição dele inspira cuidados.
“Eu tenho um quadro clínico na minha frente. Um animal que se arrasta, que não consegue nem se limpar, ele não consegue se virar, para se limpar. Ele não consegue ter o mínimo de deslocamento, ele está com suas faixas metabólicas alteradas, ele estava sob uma situação explicita de maus-tratos”, afirma o chefe do Cetas, Paulo Wagner.

Shanacris encontrou o gambá em outubro de 2021. Segundo ela, um gato trouxe o animal, ainda filhote, para dentro da sua residência. “Ele estava com uma mordida do gato. Estava machucado. Liguei várias vezes para o comando ambiental da cidade e ninguém atendeu. Quando atenderam, me disseram ‘a gente pode ir buscar, mas a gente vai colocar no mato de volta, porque aqui na nossa cidade não temos centro de reabilitação de animais silvestres’”.

O comandante dos Comandos Ambientais do RS, tenente-coronel Rodrigo Gonçalves dos Santos, afirmou que, em geral, a regra é priorizasse a soltura do animal. “Todos os animais, que são acolhidos nessa condição de risco, são levados para os centros de triagem. Esse animal, que era um filhote na época, com certeza seria leva ao Cetas, seria reabilitado e após isso, seria reencaminhado para um ambiente mais adequado e próximo do seu habitat “, explicou.

Criado dentro de casa
 
Após contato com o Comando Ambiental, ela decidiu cuidar do animal. “Entrei no grupo ‘gambás brasileiros’, que tem no Facebook, com quase 60 mil membros. Tem biólogos, veterinários de animais silvestres e pedi ajuda”, lembrou a fotógrafa. A alimentação do gambá consistia em leite em pó sem lactose, papinha de bebê, frutas e ração de gato e cachorro.

“Eu passei um paninho ali com água oxigenada para evitar infecção e fui aquecendo-o, amamentando-o de três em três horas, porque ele era muito bebê”, afirma.

Após o animal ter se curado da ferida, a mulher decidiu manter ele em casa. “Eu sou um ser humano, eu tenho um coração e o animal estava lá, uma coisa foi levando a outra”, afirma Shanacris. Apesar de ter mantido o Emilio, ela afirma saber que essa não é a sua função.

A fotógrafa informou que o animal tem liberdade para entrar e sair de casa quando quiser. “Ele andava livre pela casa, por tudo, por todos os cantos. Automaticamente ele foi ficando”, contou. Apesar disso, em uma live, ela informou que, pelo fato de o gambá ser domesticado, a porta da casa está sempre fechada e o animal não pode sair.

“Ele [gambá] estava trancado em casa. Nos inúmeros vídeos que ela postou dele, ele ia para rua com a supervisão dela”, explica a delegada.

De acordo com Paulo Wagner, do Cetas, as consequências dessa criação ilegal são inúmeras.
 
“Primeiro lugar, ele está em obesidade mórbida, segundo lugar ele não consegue fazer um caminhar minimamente normal, o que já temos certeza. Ele já tem problemas de quadris, pelo excesso de peso. Ele está de dois à três vezes maior do que é normalmente o peso desse animal. Ele provavelmente está diabético, estamos esperando os exames”, explica.

Shanacris comentou que, após a história dela com o Emilio, outras pessoas passaram a ver nela uma referência para o assunto de resgates de gambás na cidade. Desde que o animal chegou, ela alega já ter tido contato com outros animais que precisavam de cuidados, porém os devolveu para natureza.

O chefe do Cetas alerta para o risco de criar animais silvestres.

“A maioria das pessoas encontra o animal e procura o órgão ambiental, porque sabe que não é um animal do nosso convívio, não é um animal doméstico, não sabe o que o animal tem ou não tem. Existe várias patologias que circulam pela natureza e você hospedando um animal desses na sua casa, você está se expondo a isso. Quando você coloca um animal de vida livre dentro de sua casa, você o expõe, aos nosso patógenos que nós herdamos naturalmente”, explica.

Animais silvestres em redes sociais

O uso de animais silvestres para ganhar engajamento nas redes tem se popularizado. São inúmeros os vídeos e fotos espalhados com milhares de acessos. Apesar de muita gente achar a prática engraçada e “fofa”, de acordo com a delegada Samieh Saleh, isso incentiva outras pessoas a manter esses animais em casa de forma ilegal.

Shanacris disse que a ideia de criar um perfil no Tik Tok para o Emílio veio para desmistificar algumas percepções que as pessoas têm do gambá. Segundo a fotógrafa, as redes sociais com imagens do animal nunca tiveram retorno financeiro.

“Como existia muito preconceito com esse animal, falando que eles fedem, que eles não prestam eu comecei a fazer essas lives para desmentir isso. Que ele é um animal lindo, não é praga. Ele é importante para a natureza, não é para sair pegando, não é para matar. Ele é o gari do meio ambiente”, relata.

Sobre o grupo do Facebook com supostas informações de gambás, Paulo Wagner explica que não é possível se basear em informações online para criar um animal que não é doméstico. “Não tem como confiar em um grupo com 60 mil pessoas aleatórias, que podem dizer que tem uma formação no assunto, mas com se confirma a veracidade disso?”, especula.

Além disso, o chefe do Cetas afirma que, além de antiético, qualquer profissional da área (veterinários, biólogos, entre outros), que, ao invés de reprimir a ação, incentiva a permência destas espécies em cativeiro, está sendo conveniente com o crime.

Resgatei um animal silvestre, o que fazer?

O Rio Grande do Sul conta com 39 Comandos Ambientais. Nem toda cidade tem uma sede, porém todas as unidades estão preparadas para atender denúncias e resgates em todas regiões do estado.

Os endereços e contatos dos comandos estão disponíveis no site da Brigada Militar. Os patrulheiros estão preparados para dar as informações necessárias, de acordo com a situação. Nem todos as cidades tem centro de triagem de animais silvestres, mas contam com suporte veterinário, como o da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Em certos casos, algumas cidades têm parceria com locais privados, e a partir de convênios entre prefeituras e empresas é possível realizar alguns atendimentos urgentes. “O padrão é a gente levar para o Cetas mais próximo, de onde o animal foi encontrado”, explica o tenente-coronel Rodrigo Gonçalves dos Santos.
 
De acordo com informações do comandante dos Comandos Ambientais, em alguns casos, a própria Polícia Militar atende a ocorrência dependendo da urgência.

“É normal você, por exemplo, fazer um resgate de um animal em uma estrada, algo que acontece muito por aqui. Você não vai sair correndo imediatamente atrás de um Centro de Triagem para entregar o animal. Às vezes, acontece de a pessoa ficar um, dois dias até estabelecer contato com alguma autoridade ou aguardar que o órgão responsável vá buscar o animal na casa de quem realizou o resgate. Mais do esse tempo necessário, para a entrega do animal, é proibido”, explica Paulo Wagner.
A Lei de Crimes Ambientais (Lei 9.605/1998), estabelece como crime, o ato de matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida, submetendo o infrator à pena de detenção de seis meses a um ano, e multa.

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