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22/05/2018 às 14h19min - Atualizada em 22/05/2018 às 14h19min

Fundo global investe contra extinções da fauna e flora no Brasil

O Brasil vai receber US$ 13,4 milhões (cerca de R$ 50 milhões) para combater a extinção da fauna e flora nacionais.

ANDA - Agência de Notícias de Direitos Animais
‘Ambientalismo de raiz’: A jaguatirica está entre as 2.775 espécies ameaçadas beneficiadas pelo fundo criado por iniciativa do Banco Mundial (Foto: Marcelo Sayão)
A disputa era com girafas, leões e elefantes. Mas o pica-pau-amarelo, o cachorro-vinagre e a anta saíram-se vencedores e trouxeram para o Brasil os recursos do mais tradicional fundo verde internacional. Lançado hoje, o projeto Pró Espécies recebeu US$ 13,4 milhões (cerca de R$ 50 milhões) para combater a extinção da fauna e flora nacionais, uma rara boa notícia para o meio ambiente no país, que tem amargado perdas em unidades de conservação e investidas no Congresso contra o rigor no licenciamento ambiental e a segurança no controle de agrotóxicos.

O projeto é financiado pelo Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF, na sigla em inglês) e resgata um ambientalismo “de raiz”. Já faz tempo que o GEF, criado por iniciativa do Banco Mundial, não patrocinava projetos com plantas e animais ameaçados no Brasil. A maior parte das iniciativas recentes tinha enfoque eminentemente social. A volta ao ambientalismo-raiz traz, na verdade, pragmatismo e modernidade. Ao proteger uma espécie, considera-se todo o ecossistema e os que dele dependem, o que inclui os seres humanos.

‘Visão integrada’
Não são apenas as andorinhas que sozinhas não fazem verão. “Uma espécie não vive sem a paisagem. E esta não existe sem a espécie. É uma visão integrada, que usa espécies como símbolos”, explica Rosa Lemos de Sá, CEO do Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio), a agência implementadora dos recursos do GEF.

Ainda assim, não foi nada fácil convencer o GEF, que preferia colocar dinheiro na África para proteger a mais do que famosa fauna de leões, elefantes e companhia. Espécies totalmente brasileiras como o pica-pau-amarelo ganharam espaço porque estão na essência da biodiversidade, de que todo mundo já ouviu falar, mas que pouca gente conhece e o país desperdiça.



“Ao protegê-las, conserva-se o território e tudo o que ele inclui, como a água, o clima e os insetos polinizadores da agricultura, por exemplo”, afirma Marília Marques Guimarães Marini, coordenadora geral de Conservação de Espécies do Ministério do Meio Ambiente, elaborador do projeto, que será executado pelo WWF-Brasil.

Das 141 culturas agrícolas do Brasil, 85 dependem da polinização por animais (em sua maioria, insetos). A nossa flora, da qual só uma pequena parte foi investigada em detalhe, presta serviços à indústria de medicamentos e cosméticos. Pelo menos 245 espécies estão na base de produtos, número com potencial de se multiplicar muitas vezes.

Pica-pau, cachorro e anta estão entre as 2.775 espécies ameaçadas beneficiadas, uma lista que inclui macacos, como os muriquis, e felinos como onças, jaguatiricas e a fofura máxima das selvas, o maracajá, que se parece uma onça pintada do tamanho de um gatinho. Há ainda tamanduás, tatus e veados, dentre outros. Todos eles têm a companhia de árvores e flores que fazem bonito, como o jequitibá-rosa e o jacarandá-da-Bahia.

Mas eles nem sequer são a meta principal do Pró Espécies. Este mergulha nas profundezas da biodiversidade e tem como alvo 290 espécies criticamente ameaçadas de extinção e não protegidas por qualquer medida de conservação. Elas vivem em 12 áreas da Amazônia, Mata Atlântica, Cerrado, Caatinga e Pampa, que somadas chegam a nove milhões de hectares, em 13 estados.



Dominada por plantas, peixes de água doce e invertebrados, a lista revela um Brasil ignorado, prestes a mostrar seu valor. É povoado, por exemplo, por peixes-das-nuvens que vivem em poças d’água. Caso do Austrolebias univentripinnis, menor que o próprio nome, descoberto em 2005 nas imediações da Lagoa Mirim, no Rio Grande do Sul. Entre as plantas, há sobreviventes como a Peixotoa bahiana, que só existe na fronteira da Bahia, junto à fronteira com Goiás e Tocantins, bem na linha de frente da expansão da soja no Cerrado. O último exemplar registrado do arbusto de flores amarelas estava na borda de uma rodovia, a BR-020.

Os invertebrados selecionados podem ter papel ecológico, mas nasceram sem qualquer atributo que remeta a charme e beleza. Um deles é o onicóforo Epiperipatus adenocryptus, nome que não ajuda ninguém. A grosso modo, uma criatura de poucos centímetros e semelhante a uma mistura de verme com lagarta chifruda, sem nome popular além de embuá-de-chifre. Pois o Sol, por vezes, brilha mesmo para todos, e hoje o animalzinho que espreita insetos em florestas de Minas Gerais faz sua entrada triunfal no mundo da conservação, na seleta lista dos 290 ilustres desconhecidos do Pró Espécies.



O projeto vai investir, por exemplo, em educação ambiental, treinamento e incentivo de proprietários de áreas consideradas estratégicas. Também vai colaborar com governos estaduais e financiará a instalação de sistemas de inteligência para o combate à caça e ao tráfico de animais silvestres, além da extração ilegal de plantas. Outra frente, destaca Fabio Leite, coordenador da agência GEF do Funbio, é o controle de espécies invasoras.

A voz do pica-pau-amarelo
Ameaçado por desmatamento, caça, tráfico e competição com invasores, tenta sobreviver o pica-pau-amarelo (Celeus flavus), uma das vozes mais características das primeiras florestas que os portugueses da expedição de Pedro Álvares Cabral encontraram ao chegar ao Brasil, na Bahia. É um genuíno representante da Mata Atlântica de luxo e glória original. Hoje, ele praticamente desapareceu, assim como a floresta, frisa Luis Fabio Silveira, do Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo, estudioso da espécie. Está praticamente restrito a ilhotas de mata concentradas no Espírito Santo. “Uma área essencial para milhares de espécies”, diz Bianca Chaim Mattos, analista ambiental do MMA. Dentre essas espécies estão algumas das quais o pica-pau come os frutos, como a goiaba-azeda, o jambolão-do-mato e o guamirim — todas em risco.



No WikiAves, que reúne os observadores de aves no Brasil, a gravação disponível da voz do pica-pau-amarelo foi feita em 2012, no município de Belmonte, na Bahia. Não muito longe de onde Cabral desembarcou e cujo nome homenageia a cidade natal do navegador português. A ave de plumagem exuberante já não é mais ouvida por lá. O Pró Espécies promete tentar que não se cale de vez.

Faveiro-de-wilson é símbolo de extinção das plantas nacionais
Raro entre os raros, símbolo dos símbolos de extinção das plantas brasileiras, o faveiro-de-wilson (Dimorphandra wilsonii), nativo de Minas Gerais, espera uma chance para crescer na área que lhe coube no Jardim Botânico do Rio, um dos três lugares do Brasil onde é cultivada. Os outros são os jardins botânicos de Belo Horizonte e de Paulínia (São Paulo). Restam pouco mais de 200 exemplares na natureza, espalhados pelo Cerrado e pela Mata Atlântica de Minas Gerais. Por isso, o faveiro está entre as espécies que o novo programa de financiamento pretende beneficiar.

Plantada perto da entrada principal do parque, a árvore ainda está na infância. Não chega nem a dois metros de altura, e seus galhos não passam de gravetos — adulta, alcançará mais de 15 metros. Ainda assim, é uma das esperanças para salvar a espécie, considerada criticamente em perigo de extinção.

A árvore está ameaçada a ponto de merecer a criação do Plano de Ação Nacional para a Conservação do Faveiro-de-wilson, de uma lei estadual em Minas Gerais e de duas leis municipais — em Paraopeba e Caetanópolis — específicas para sua proteção. Ela não está na lista das 290 justamente porque tem um plano nacional.

O crescimento urbano e a destruição de matas pela agropecuária levaram o faveiro-de-wilson, espécie naturalmente rara, ao limite. A árvore leva o nome de seu descobridor, Wilson Nascimento, que trabalhava como mateiro em Paraopeba, quando a descobriu na década de 1960.

Nota da Redação: entre as ações do projeto Pró Espécies, está o controle de espécies consideradas invasoras. Por não ter sido especificada a forma como será realizado esse controle, a ANDA acredita ser importante reforçar que essa ação não pode, em hipótese alguma, seguir a proposta do deputado federal Valdir Colatto (PSDB) – que permite a caça de animais considerados invasores e que ameacem a agropecuária -, já que retirar a vida de animais sencientes não deve ser vista como uma atitude correta a se tomar. Espécies consideradas invasoras são aquelas introduzidas em um ambiente que não pertence a elas ou com superpopulação devido a um desequilíbrio causado por humanos. O controle populacional não pode, portanto, atentar contra a vida de animais que estão em ambiente inadequado devido à ação humana. Ele deve ser feito através de posturas éticas de respeito ao meio ambiente, que incentivem o fim da caça, do tráfico, do desmatamento e de qualquer outra postura que faça com que a humanidade interfira no meio ambiente.

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