AtaNews Publicidade 728x90
04/02/2021 às 15h22min - Atualizada em 04/02/2021 às 15h22min

Senatus Populusque Brasiliensis (O senado e povo brasileiro)

Lucas Lanna Resende
Assessoria de Imprensa

No exato momento em que o deputado Arthur Lira (Progressistas-AL) tomava posse como novo presidente da Câmara dos Deputados, às 23h07 do dia 1º de fevereiro, o assunto mais comentado da internet era Karol Conká, uma rapper curitibana que despertou a fúria dos internautas por sua postura em um reality show. 

Ao passo que a indignação brasileira era destinada a um programa de televisão, Lira se beneficiava do cargo de presidente da Câmara para anunciar seu primeiro ato: excluir praticamente todos os adversários de cargos do comando da Casa, trocando-os por aliados - medida revertida depois que parlamentares entraram com ação no STF. A justificativa do deputado foi a de que a oposição teria perdido o prazo estipulado para registrar no sistema seu apoio ao concorrente, Baleia Rossi (MDB-SP).

Apoiado publicamente por Jair Bolsonaro (sem partido), Lira coleciona polêmicas e é dono de uma robusta ficha criminal. Acusado de violência doméstica, lesão corporal, corrupção passiva por suposta propina recebida de um então dirigente da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) e da Queiroz Galvão em troca de apoio partidário, e corrupção na Petrobras; Lira é que vai comandar e pautar o legislativo pelos próximos dois anos, interferindo diretamente na vida dos brasileiros.

Para conseguir os 302 votos e se eleger presidente da Casa, o deputado precisou contar com uma mega-operação do Palácio do Planalto. Nos dias que antecederam a votação, Bolsonaro liberou R$ 3 bilhões em repasses extras para parlamentares que se comprometeram a votar no alagoano. A relação de pagamento está em planilha do ministro-chefe da Secretaria de Governo, General Luiz Eduardo Ramos, divulgada recentemente pela imprensa.

A aproximação entre Bolsonaro e Lira, um dos caciques do centrão - bloco político rechaçado pelo presidente em 2018 e ao qual o chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência, General Heleno, se referiu cantando "se gritar pega centrão, não fica um, meu irmão" - é motivada única e exclusivamente pelo pavor que o chefe do executivo tem da palavra impeachment, que veio ganhando contornos reais nas últimas semanas devido à negligência do Governo Federal com a situação de caos em Manaus e com a aprovação da Coronavac, vacina que Bolsonaro tentou sabotar até o fim só porque foi trazida pelo governador paulista, João Doria (PSDB), desafeto do atual presidente e possível rival nas eleições de 2022.

A vitória de Lira, portanto, sela o fim de uma postura que o legislativo vinha apresentando nos últimos dois anos, como contrapeso aos arroubos autoritários de Bolsonaro. Além disso, projeta um horizonte turvo para os brasileiros. Certamente o centrão vai exigir mais repasses em troca da manutenção do apoio ao presidente da República e, consequentemente, a soma de recursos disponíveis para desvio será bem maior.

Um desfecho trágico para Bolsonaro, por sua vez, também não pode ser visto como um alento. Em caso de impeachment, a conta chega para os mais pobres - entre as diversas consequências, há a instabilidade na economia, que hoje tem dívida pública superior a 90% do PIB, e efeitos concretos que se refletem no cotidiano das pessoas, como aumento do preço de produtos, como gás, gasolina, luz, entre outros.

No entanto, isso parece não importar para os brasileiros. A inquietação mais urgente agora é com Karol Conká. É muito mais divertido, de fato, acompanhar altercações de gente inexpressiva na TV do que seguir e participar das atitudes que definirão verdadeiramente a vida dos demais. À vista disso, enquanto a crise financeira não for sentida no bolso do indivíduo e houver um reality show recheado de polêmicas, os brasileiros continuarão se contentando com essa modernização do famigerado "pão e circo".
 

 


Link
Tags »
Notícias Relacionadas »
Comentários »