No interior do amplo salão na zona sul de São Paulo, um rhythm and blues envolvente embalava o passeio e a dança de seletos aficionados, que exibiam os seus corpos quase despidos e encobriam parcialmente os seus rostos em estilosas máscaras venezianas. A luz suave derramada por luminárias japonesas suspensas, o papel de parede com intrincados entrelaçamentos de linhas formando flores, serpentes e dragões, a predominância do vinho e do dourado nos móveis e no tapete persa, tudo mergulhava o ambiente numa atmosfera de requinte e sensualidade.
Por entre as silhuetas desenhadas por flash's de luz negra, destaca-se um homem moreno, cabelos ondulados e negros quase nos ombros, passos lentos e seguros, olhar penetrante, dono daquele sorriso sutil que aparece quando cremos estar no controle da situação. É um dos poucos sem máscara. Alinhado e seguro, ele caminha em direção ao meio do salão, o local combinado, e, ali chegando, se enxerga num espelho, moldura de madeira e acabamento em bronze rubi, abaixo do letreiro luminoso onde se lê em estilizada fonte cursiva: "Scarlett".
O homem, cujo reflexo no espelho trazia uma aura de mistério – impressão essa reforçada pelo contraste da sombra que tocava o lado esquerdo do seu rosto – aproveita a ocasião para jogar os cabelos para trás, esticar a jaqueta de couro para baixo, evidenciando o tórax bem tonificado, e assentir com a cabeça, num gesto tácito de autoaprovação. Nesse interlúdio, uma mulher loira, corselete preto, micro saia vermelha e saltos altos, cruza a frente do homem misterioso, atraindo-lhe a atenção para o seu rebolado firme e sensual. Instintivamente, ele vira o pescoço, acompanhando-a, e só é interrompido nesse movimento pela interposição de uma outra presença feminina. Era uma presença radiante e cheia de personalidade, uma morena de cabelos nas costas, cintura fina e quadril exuberante, que não era apenas aguardada, mas uma das razões para o homem misterioso estar naquele ambiente lúbrico.
"Boa noite, senhor Eros!", disse ela, numa fala lenta, arrastada e musical, acentuando cada palavra com breve movimento lateral de quadril. "Agora, sim, eu acredito que 'ser de luz' frequenta casa de sw*ng", ironizou. Eros entendeu a referência, sorriu num simpático arquear de lábios, e não pode evitar por fração de segundo baixar os olhos em direção àquele decote, que era mais uma promessa do que eu um presente, enquanto solicitava, num gesto mudo, a mão da dama para beijá-la. "Olá, senhorita Sabine! São Eros ao seu dispor!" Gargalharam.
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Trecho do conto A Noite Escarlate - Entre o Desejo e a Meditação. Para acessar o texto completo acesse o link na Amazon (+18): https://a.co/d/6wJWDvc
