Foto: Divulgação Faltando exatos 11 meses para a eleição nos EUA, o presidente Donald Trump tenta equilibrar-se entre o pedido de impeachment, a queda na taxa de aprovação (em setembro, o percentual passou de 44% para 38%, segundo pesquisa realizada pelo The Washington Post) e a guerra comercial com a China, que faz seus eleitores esperarem recessão para 2020. Logo cedo, Trump usou as redes sociais para anunciar uma sobretaxa ao aço brasileiro e argentino.
“O Brasil e a Argentina têm liderado uma desvalorização maciça de suas moedas, o que não é bom para os nossos agricultores. Portanto, com efeito imediato, restaurarei as tarifas de todos os aços e alumínio enviados para os EUA a partir desses países”, escreveu. Os EUA são o principal destino de ferro brasileiro.
Ao tomar esta atitude, o mandatário e sua política protecionista jogam com um eleitorado caro nos Estados Unidos, os da Pensilvânia, um dos estados-chave na eleição estadunidense, ao lado de Ohio, Michigan e Flórida, de acordo com analistas e diplomatas ouvidos pelo HuffPost, onde a disputa é considerada imprevisível.
A Pensilvânia é o maior polo siderúrgico dos EUA e, em 2016, rendeu ao mandatário uma diferença de apenas 44.292 votos - 0,73% - em relação à adversária Hillary Clinton. Foi um dos estados com resultado mais apertado, como no Michigan onde o republicano venceu por 10.704 votos. No último dia da campanha em 2016, os dois locais foram visitados por Trump de última hora.
Recados de todos os lados Não é a primeira vez que os EUA recuam na relação com o Brasil. Após encontro com o presidente Jair Bolsonaro na Casa Branca em março, Trump garantiu que apoiaria a entrada do País na OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico). Contudo, em carta enviada meses depois à entidade, o amparo americano foi somente à Argentina e Romênia, sem nenhuma menção sequer ao Brasil.
Não houve alertas de que a sobretaxa poderia acontecer. Semana passada havia interlocutores da equipe econômica brasileira em Washington e pouco se falou em aço.
Foi justamente nesta passagem pelos Estados Unidos que o ministro da Economia, Paulo Guedes, se disse despreocupado com os recordes de cotação do dólar, aos quais afirmou que era bom o País se acostumar.
“Achei absolutamente compreensível. O juro baixou, está em 5%. Quando tem política fiscal mais forte e juro mais baixo, o câmbio de equilíbrio é mais alto. O Brasil é agora um País interessante, com juro bastante baixo. Os investimentos vão começar e vai retomar o crescimento”, disse o ministro.
Ao falar dessa forma, o chefe da economia passou a mensagem de que o País vai usar o câmbio como estratégia comercial, contra o que o governo normalmente faz, de intervir para evitar a disparada da moeda americana, porque isso afeta a inflação interna. O mundo financeiro e político funcionam de interpretações e nuances.
Ao longo da segunda, desde cedo, a equipe de Jair Bolsonaro buscou entender o movimento de Trump. O ministro Paulo Guedes foi cobrado pelo chefe.
Em ação, a diplomacia Está, agora, nas mãos da equipe diplomática do governo solucionar a situação. O chefe do Itamaraty, Ernesto Araújo, e Nestor Foster, cuja indicação para a embaixada do Brasil nos EUA foi oficializada na semana passada, também foram colocados contra a parede.
De acordo com Araújo, a estratégia é “negociar”, mas o anúncio feito pelo Twitter “não preocupa, nem abala a relação com os EUA”.
À tarde, uma nota conjunta dos ministérios da Economia, Relações Exteriores e Agricultura destacou que há contato com interlocutores em Washignton. “O governo trabalhará para defender o interesse comercial brasileiro e assegurar a fluidez do comércio com os EUA, com vistas a ampliar o intercâmbio comercial e aprofundar o relacionamento bilateral, em benefício de ambos os países”, destacou a mensagem.
Bolsonaro quer que os interlocutores façam Donald Trump mudar de ideia antes que a ameaça, por enquanto um tuíte, concretize-se. Em entrevista à imprensa, disse que ligaria para o mandatário norteamericano.
“Não vejo isso como retaliação. Vou conversar com ele [Trump] para ver se não nos penaliza com a sobretaxa no preço do alumínio. A ligação dele, no Twitter dele, é a questão das commodities, a nossa economia basicamente vem das commodities, é o que nós temos. Espero que tenha o entendimento dele, que não nos penalize no tocante a isso, e tenho quase certeza de que ele vai nos atender”, afirmou Jair Bolsonaro.
No fim do dia, o porta-voz da Presidência, general Rêgo Barros, destacou, porém, que o presidente não vai telefonar para Trump antes de conhecer melhor a decisão. “Seria intempestivo efetivar uma ligação em tempo inapropriado em face do desconhecimento profundo do tema.”
Uma ala palaciana que defende a aproximação brasileira com a China, o que também se acredita estar entre os motivos da fala do presidente dos EUA, aproveitou o movimento de Trump para falar ao presidente Jair Bolsonaro como não se pode “confiar nos norte americanos” como amigos, reiterar que sempre existe na relação com eles preços altos demais a pagar. Mas neste quesito, ainda há muito por vir e ver.